OPINIÃO

A luta dos jornais 


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São verdadeiros herois os que perseveram a produzir jornais físicos no interior do Brasil. Os tempos de internet estão matando os diários que faziam parte da História e que eram – e em certa medida, continuam a ser – a primeira companhia dos madrugadores de nosso País.

Mas a luta pela publicação do jornal em papel é antiga e nela se empenharam jornalistas de renome, como Alcindo Guanabara (1865-1918), que dirigiu “A Imprensa” no Rio de Janeiro. Tinha de ser um factótum: realizava o prodígio de ditar a três redatores, simultaneamente, enquanto caminhava de um lado para outro. Para um, uma notícia, para outro, comentário político. Para o terceiro, uma crônica elegante.

O jornal estava em situação extremamente difícil. Não havia dinheiro para pagar vários redatores. O diretor, sozinho, tinha de chamar a si a responsabilidade e incumbência de vários deles. E a tudo atendia, efetivamente, com os poderes e recursos de seu virtuosismo profissional. De seu entusiasmo e idealismo.

Depois de encerrar o jornal, naquele tempo de linotipos e de composição artesanal de cada página, ele saía para jantar. Voltava de madrugada, escrevia o editorial com uma letra que era a tortura e o desespero dos tipógrafos.

Certa manhã, já ao raiar do dia, o revisor o interpela.

- “Dr. Arlindo, dá licença?”

- “Pois não. O que foi?”

O revisor mostra os originais do editorial:

- “Não conseguimos entender estas palavras que pusemos num círculo!”.

Arlindo ergue a cabeça sonolenta. Põe os óculos e começa a examinar. Depois de alguns instantes, olha o revisor e devolve os originais.

- “Também não consegui ler”.

E dá uma ordem:

- “Ponha aí uma palavra que dê sentido”.

Voltou a fechar os olhos, as pernas sobre a mesa, mãos cruzadas no peito, dominado pelo sono e à espera da impressão do jornal.

A vida nas redações dos jornais era muito interessante. Havia a necessidade de fazer clichês, peças de metal para imprimir fotos e ilustrações. Como estou a escrever para a Imprensa desde 1961, vi muita coisa. O início foi bem interessante.

Meu tio, Monsenhor Venerando Nalini, celebrava seu Jubileu Áureo. Eu fui a “O Jundiaiense”, que era o “Jornal dos 3 Fernandos” (Fernando Gasparian, Fernando Pedreira e Fernando Henrique Cardoso-FHC) e lá estava o Waldemar Gonçalves como redator-chefe. Também o Jayme Martins. Quando pedi que noticiassem, Waldemar me pediu que redigisse. E, gostando do texto, me convidou para escrever no jornal.

Nunca mais saí. ei pela “Folha de Jundiaí”, pelo “Diário de Jundiaí”, finalmente pelo nosso JJ, o “Jornal de Jundiaí”. Com breve agem pela “Tribuna”, que era editada por Antonio Carlos Avallone. Tobias Muzaiel foi um empreendedor e inovou a Imprensa de nossa Terra. Seus filhos Tobias Júnior e Sueli prosseguem sua meritória obra.

Quanto a letras ilegíveis, sou amigo de Ives Gandra da Silva Martins, que é um artesão de hieróglifos. Ninguém consegue saber o que ele escreveu. A gente recorre à sua secretária, que é tradutora de suas mensagens. Todas muito eruditas e elegantes.

É apaixonante a vida dos jornais, em luta cada vez mais intensa com as redes sociais, que não têm o charme e a sedução do papel. E fazem enorme desserviço quando semeiam ira, ódio, acentuam a polarização e o ressentimento. Vamos prestigiar os jornais!

José Renato Nalini é reitor, docente de pós-graduação e Secretário-Executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo ([email protected])

Comentários

1 Comentários

  • VIVALDO JOSE BRETERNITZ 05/06/2025
    Excelente texto, como de hábito. Mas os jornais aqui da terrinha precisam se ajudar, por exemplo deixando de trazer crimes praticados por ladrões de galinhas e abrindo espaço para mais colaboradores qualificados, que estão disponíveis (de graca) na cidade.