
Referência no País como cientista político e escritor, Rubens Figueiredo, atualmente morador da Capital paulista, voltou a Bauru para lançar o livro "Sofrendo Feliz da Vida - Alegria e angústia de ser brasileiro". Na obra, ele explora a contradição da sociedade brasileira, que aparece no topo dos rankings internacionais de felicidade ao mesmo tempo que se destaca em índices de desigualdade, violência e crime. Natural de São Paulo, com 1 ano mudou-se para Bauru, onde foi criado até os 15. Bacharel em Ciências Sociais e pós-graduado em Ciência Política pela USP, é diretor do Cepac - Pesquisa e Comunicação, empresa especializada em consultoria em pesquisas, marketing político e elaboração de indicadores. Atende governos municipais, estaduais e federal, além de entidades de classe e organizações ligadas ao futebol.
Dono de uma trajetória de destaque no cenário nacional, ele integrou o Conselho de Comunicação da Presidência da República, na gestão Michel Temer, e escreveu, em parceria com Fernando Henrique Cardoso, o paper Reconciling capitalism with democracy: the Brazilian Case, apresentado em seminário internacional na Itália. Rubens Figueiredo atua como consultor da Fundação Espaço Democrático, integra o Conselho Superior de Estudos Avançados da Fiesp e o Conselho Consultivo da Associação Comercial de São Paulo (ACSP). É também membro do Conselho Deliberativo do Club Athletico Paulistano, onde foi diretor de comunicação e marketing.
Nesta entrevista Rubens relembra sua juventude em Bauru, analisa os principais desafios do País, como a desigualdade, a polarização e o avanço do conservadorismo. Também avalia os cenários para as eleições de 2026 e o papel das instituições no Brasil. Leia os principais trechos.
JC — O senhor revisitou Bauru para o lançamento do livro. Como foi essa volta?
Rubens — Sempre mantive contato com a cidade. Meus pais moraram aqui por muito tempo e, sempre que podia, vinha rever amigos. Fiquei emocionado ao reencontrar tanta gente. A cidade mudou muito. Meu pai, inclusive, foi um dos primeiros a construir no Jardim Estoril, quando tudo ali ainda era inexplorado.
JC — O senhor falou sobre sua juventude em Bauru. Como foi essa fase?
Rubens — Saí daqui aos 15 anos para fazer cursinho em Ribeirão Preto. Depois, fui para São Paulo, fiz o terceiro colegial e entrei em medicina, na PUC de Sorocaba. Mas percebi que aquilo não era o que eu gostava.
JC — Como decidiu mudar de carreira?
Rubens — Sempre me interessei por política, talvez influenciado por um tio que era cientista político e pela minha atuação no Diretório Central dos Estudantes, ainda na época da medicina. Daí fui estudar ciência política na USP, já aos 22 anos. Foi uma decisão difícil, quase matei minha mãe.
JC — Como foi a participação no movimento estudantil, ainda no período da ditadura militar?
Rubens — Na PUC de Sorocaba, fizemos um protesto contra a entrega do título de cidadão sorocabano ao secretário de Segurança, Erasmo Dias, que havia invadido a PUC-SP. Imprimimos panfletos e saímos no meu carro para distribuir, mas fomos pegos por agentes do governo. Eles revistaram o carro que eu estava, inclusive rasgando o banco. Eu tinha uma fita com a música "Apesar de Você", do Chico Buarque, que era proibida. Estava no tocador do carro e eu pensava que, se ouvissem, minha situação iria complicar bastante. Graças a Deus, não chegaram a ouvir.
JC — Como foi sua trajetória depois da universidade?
Rubens — Trabalhei com representação empresarial, fiz uma pesquisa na Europa sobre entidades patronais e, a partir daí, fui apresentado ao Fernando Henrique Cardoso, que na época era ministro das Relações Exteriores, e colaborei com ele na elaboração de um trabalho que ele apresentou na Itália.
JC — Como foi essa colaboração com o Fernando Henrique?
Rubens — Ele precisava de um estudo sobre representação empresarial, que era um tema que eu estudava. Brinco que achei que ele fosse ficar com metade do pagamento, mas ele me deu tudo, dois mil dólares, que ajudaram bastante na época.
JC — Agora, sobre política nacional. O senhor acredita que a polarização é um dos grandes problemas do País. Por quê?
Rubens — A polarização é inimiga do raciocínio. [Friedrich] Nietzsche [filósofo alemão] dizia que o maior inimigo da verdade não é a mentira, mas a convicção. Quando a sociedade está cheia de convicções absolutas, perde a capacidade de debater com serenidade. Hoje, o Brasil vive de rejeições: não se vota a favor, mas contra o outro.
JC — O senhor acredita que essa polarização está perto de acabar?
Rubens — Toda mobilização intensa acaba gerando cansaço. O Brasil está chegando nesse ponto. Já há pesquisas mostrando que muita gente evita falar de política porque o ambiente ficou inável. Mas, apesar disso, as ideias que sustentam a polarização, tanto à esquerda quanto à direita, continuarão presentes.
JC — Como o senhor avalia o avanço do conservadorismo no Brasil?
Rubens — Esse é um fenômeno mundial. O eleitorado está mais conservador, mais tolerante com soluções não democráticas. Basta ver casos como Trump, Orbán e Milei. No Brasil, o bolsonarismo ainda tem muita força. A ideia que Bolsonaro representa está viva. É provável que ele fique inelegível, talvez até preso, mas o bolsonarismo não vai desaparecer. Vai buscar novos nomes, talvez dentro da própria família.
JC — O centro político tem chance de se viabilizar em 2026?
Rubens — Acho difícil. O discurso do centro é técnico, racional, e a polarização exige paixão, exige confronto. O centro fala de reforma do Estado, racionalização dos gastos... isso não mobiliza multidões. É pouco provável que um candidato de centro consiga furar essa lógica.


